O ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal, determinou que o presidente Jair Bolsonaro preste depoimento pessoalmente, no inquérito que apura suposta interferência na Polícia Federal, aberto após acusação do ex-ministro Sergio Moro, da Justiça e Segurança Pública. O decano do STF não adotou o procedimento sugerido pelo procurador-geral da República, Augusto Aras, para quem o depoimento poderia ser tomado por escrito.
Celso de Mello destacou, em sua decisão, que a possibilidade de depoimento por escrito é uma prerrogativa de presidentes apenas nos casos em que são testemunhas, e não quando são investigados – o que é o caso. O inquérito foi aberto em abril após Sergio Moro pedir demissão apontando interferência indevida na PF. O ex-ministro entregou o cargo por não concordar com a demissão do diretor-geral da PF, Maurício Valeixo, determinada por Bolsonaro.
Relator do caso, Celso de Mello também autorizou Moro a enviar perguntas a serem respondidas ao presidente. Os questionamentos deverão ser feitos por meio dos advogados do ex-ministro. “A inquirição do Chefe de Estado, no caso ora em exame, deverá observar o procedimento normal, respeitando-se, desse modo, mediante comparecimento pessoal e em relação de direta imediatidade com a autoridade competente (a Polícia Federal, na espécie), o princípio da oralidade, assegurando-se ao Senhor Sérgio Fernando Moro, querendo, por intermédio de seus Advogados, o direito de participar do ato de interrogatório e de formular reperguntas ao seu coinvestigado”, escreveu Celso de Mello, na decisão, assinada em 18 de agosto.
Em junho, em declaração no Palácio da Alvorada, Bolsonaro disse acreditar no arquivamento do inquérito e que não via problemas em prestar depoimento pessoalmente.
“Eu acho que esse inquérito que está na mão do senhor (ministro) Celso de Mello (do Supremo Tribunal Federal) vai ser arquivado. A PF vai me ouvir, estão decidindo se vai ser presencial ou por escrito, para mim tanto faz. O cara, por escrito, eu sei que ele tem segurança enorme na resposta porque não vai titubear. Ao vivo pode titubear, mas eu não estou preocupado com isso. Posso conversar presencialmente com a Polícia Federal, sem problema nenhum”, disse o presidente, na ocasião.
Celso de Mello está de licença médica desde o dia 19 de agosto. No entanto, o decano da Corte, que se aposenta em novembro, cita artigo da Lei Orgânica da Magistratura (Loman) que lhe permite divulgar decisões que já estavam prontas antes do período do afastamento. A decisão de Celso é datada do dia 18 de agosto.
A assessoria do STF informou que a inesperada internação hospitalar e posterior cirurgia do ministro Celso de Mello impediu que ele assinasse a decisão, embora já estivesse pronta.
Na visão do procurador-geral da República, o presidente tem o direito de optar por enviar uma manifestação por escrito, ir pessoalmente ou mesmo ficar em silêncio. O parecer dele foi entregue a Mello em 2 de julho, após o relator ter enviado uma consulta à PGR. Aras citou um precedente no Supremo, quando o ministro Luís Roberto Barroso, em 2017, autorizou depoimento por escrito do então presidente Michel Temer, investigado no chamado Inquérito dos Portos.
Para Aras, mesmo sem estar previsto na lei, o depoimento de presidente da República deve ter a mesma regra, seja ele investigado, seja ele uma testemunha de um caso. “Dada a estatura constitucional da Presidência da República e a envergadura das relevantes atribuições atinentes ao cargo, há de ser aplicada a mesma regra em qualquer fase da investigação ou do processo penal”, disse Aras, ao justificar o depoimento por escrito.
Com informações adaptadas da Agência Estadão Conteúdo