O uso excessivo de aparelhos eletrônicos, em especial o celular, tem sido objeto de reclamação recorrente dos pais de adolescentes. Em casos extremos, o usuário não consegue viver sem o equipamento. Quando fica longe do aparelho, o jovem ou a garota sente sintomas físicos e psíquicos pela falta do objeto.
Esse tipo de comportamento é descrito pelos pais com filhos em acompanhamento no Adolescentro e que não sabem como agir diante da situação. Mesmo não havendo um grupo de trabalho específico sobre o tema, a dependência tecnológica está presente na maioria dos atendimentos.
“Muitas vezes, a queixa que vem não é diretamente sobre a dependência tecnológica. Ela é consequência de um isolamento, de um processo depressivo, de um processo de fobia social, dificuldade de interação. Outras vezes, ela é a causa”, confirma a assistente social Ana Miriam Garcia Barbosa, que trabalha há 16 anos com esse público.
ISOLAMENTO – Do alto da sua experiência com os jovens, Ana Miriam esclarece: “Os meninos ficam tão interessados, tão compulsivos, tão dependentes que passam a ter disfunções. Não querem mais ir à escola, para eventos de família. Buscam ficar sozinhos, mas só se tiver internet livre, um celular ou um computador disponível também”.
O Adolescentro acolhe, diariamente, pelo menos dez novos adolescentes, com idade entre 12 e 18 anos incompletos. Eles são encaminhados por escolas, por médicos das Unidades Básicas de Saúde (UBS) e ainda há os que chegam por demanda espontânea.
Foi um médico de UBS que encaminhou o garoto R.R.M.M. aos dez anos de idade para o acompanhamento no centro por causa do diagnóstico de déficit de atenção. Hoje, aos 14 anos, o adolescente permanece em tratamento ao lado da família. O pai, Sérgio Ricardo Alves de Melo, conta que aprendeu a dar limites aos filhos.
“Ano passado, ele ficou em recuperação. Perdia o sono. Quando ia ver, era uma hora da manhã, duas horas, e ele estava lá. Às vezes, até pensava que ele estivesse me enganando. Eu entrava no quarto e ele fingia que estava dormindo”, recorda Sérgio.
LIMITES – Ele lembra que o filho não queria dormir à noite. “Quando ia para o colégio cedo, estava cansado, com sono. Agora, dorme mais cedo. O desempenho na escola já está melhorando”. Sérgio conta que limitou o uso do celular a uma hora e meia por dia.
A assistente social, Ana Miriam, afirma que não há uma medida de tempo ideal para evitar a dependência tecnológica. Segundo ela, tudo depende da preservação das funcionalidades, ou seja, o uso de eletrônicos não deve afetar o rendimento nos estudos, o sono ou o convívio social.
A assistente também alerta para os prejuízos que uma abordagem agressiva e radical por parte dos pais pode trazer. “A orientação é diminuir as horas, fazer uma redução de danos, e não, simplesmente, tirar tudo. A gente trabalha muito com o controle parental, no sentido de poder regular, regular o sono, regular o horário”, sugere.
FAMÍLIA – Os profissionais do Adolescentro influenciam em mudanças de comportamentos de toda a família, a partir dos atendimentos individuais e das ações em grupo. Foi com recebendo essas orientações que Sérgio conseguiu demonstrar mais o seu afeto pelo filho adolescente.
“Aprendemos a estabelecer limites, horário de dormir, tempo de uso do celular, aproximação da família, entre pai e mãe, estar mais juntos, falar que amamos, abraçar mais vezes. Nesta fase da vida, eles não querem muito”, concorda Sérgio.
EXEMPLO – Outro alerta importante, dado por Ana Miriam, diz respeito ao exemplo que os pais estão dando no dia-a-dia, quanto ao uso dos eletrônicos, especialmente os celulares e as redes sociais. “Às vezes, eles dizem para os filhos que estão resolvendo coisas do trabalho, mas é um tempo que você não está com os meninos, não está com a família, não está no momento”, alerta.
Ana Miriam lembra que, nos grupos, não é incomum os pais dizerem que passam muitas horas no celular e que muitos trabalhos, hoje, dependem de estarem de porta aberta para as respostas. A partir desta constatação, os pais começam a se policiar”.
DEPENDÊNCIA DIGITAL – Em 18 de junho de 2018, a Organização Mundial da Saúde (OMS) reconheceu o distúrbio de jogo no Código Internacional de Doenças (CID). Com isso, a OMS passou a considerar como doença a dependência digital e a nomofobia, que é o medo irracional de estar sem celular ou aparelho eletrônico no geral.
São doenças relativamente recentes, que surgiram em função das mudanças e dos avanços tecnológicos da/na sociedade. Um levantamento aponta que 176 milhões de pessoas no mundo são viciadas em tecnologia. A dependência está relacionada ao vício em outras tecnologias, como computadores e videogames. Ou seja, quanto maior a dependência digital, maior a fobia.
Em casos extremos, a dependência digital pode ser comparada a ao uso de uma droga que, quando o usuário se vê sem ela, pode apresentar sintomas como taquicardia, sudorese, irritabilidade, impaciência, pânico.
ADOLESCENTRO – A unidade funciona das 8h às 12h e das 14h às 17h, na quadra 605, lotes 32/33, na Asa Sul.
Matéria da Agência Saúde/DF
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