O futuro presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid, senador Omar Aziz (PSD-AM), diz que “até hoje está muito mal explicado” por que o Brasil não comprou 70 milhões de doses da vacina da Pfizer.
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O governo federal recusou, em agosto de 2020, a oferta da Pfizer para compra de um lote de 70 milhões de doses, que seriam entregues em dezembro de 2020. O argumento do governo foi o de que não concordava com as condições estabelecidas pelo laboratório e que a empresa não se responsabilizava por eventuais efeitos colaterais da vacina. A fabricante diz que os mesmos termos foram exigidos de outros países que compraram a vacina, como EUA e Reino Unido.
Este é um dos temas que devem ser debatidos pela CPI que vai investigar “ações e omissões” do governo federal diante da pandemia de coronavírus.
A primeira reunião da comissão está marcada para terça-feira (27/04) e, segundo acordo entre os partidos, Aziz será eleito como presidente do colegiado e o senador Renan Calheiros (MDB-AL) será indicado como relator.
Em entrevista à BBC News Brasil, Aziz defende que pessoas convidadas ou convocadas a dar depoimento à CPI possam optar por fazer isso de forma remota. “Não temos poder de obrigar uma pessoa a ir para lá e ser contaminada.”
O senador evitou comentar o fato de o presidente Jair Bolsonaro defender o uso de medicamentos sem eficácia comprovada. No entanto, diz que não se automedica. “O que os especialistas me dizem é que não tem nada que previna covid.”
Aziz também indica que quer ouvir técnicos do Ministério da Saúde, e não apenas os titulares (atual e anteriores) da pasta.
“O ministério não é uma pessoa só, o ministério são várias pessoas. Tenha certeza absoluta que o ministro de plantão naquele momento para fazer acordo com a Pfizer não leu aquele contrato. Alguém leu para ele. Ele tem uma equipe jurídica para ler, porque ministro não tem capacidade de saber as entrelinhas que têm num contrato”, disse.
A seguir, leia os principais trechos da entrevista concedida à BBC News Brasil por videoconferência:
BBC News Brasil – O nome do senhor para a presidência da CPI da Covid tem o apoio de aliados do governo do presidente Jair Bolsonaro na comissão e, ao mesmo tempo, é visto com desconfiança por alguns parlamentares de partidos de esquerda. O que devemos esperar da condução que o sr. fará da CPI?
Omar Aziz – É uma CPI que não procura se vingar de ninguém. É uma CPI para fazer justiça e a gente quer ver uma CPI a favor da vida, pelo número de óbitos que o Brasil já teve.
Em relação a esquerda, direita, centro… Está morrendo gente da esquerda, direita, centro. Morre padre, morre pastor. Morre umbandista, morre ateu, negro, branco. Não é uma CPI de esquerda ou direita e muito menos permitirei que aquilo se torne um palanque político, porque seria um grande desrespeito ao número de óbitos que tivemos no Brasil. Temos que ter investigação séria.
BBC News Brasil – O sr disse que a CPI não é para se vingar, mas para fazer justiça. Como ela pode fazer justiça?
Aziz – Um dos grandes questionamento é por que o Brasil não criou barreira sanitária quando a covid começou. A única barreira sanitária que fizemos foi com aqueles brasileiros trazidos da China, que foram para Anápolis (GO) fazer quarentena. O que entrou de gente no meu Estado, de outros países, trazendo o vírus para cá… Temos que investigar isso.
Até hoje está muito mal explicado por que não compramos 70 milhões de vacinas da Pfizer, que daria para imunizar 35 milhões de brasileiros. Levantou-se uma tese no Brasil sobre imunização de rebanho, tese esta que não existe.
Essa doença não é como as outras, ela não vai passar amanhã. Não teremos mais carnavais, Boi-bumbá em Parintins (AM), porque tudo isso será sujeito a transmissão de covid. Essa doença é letal. Aqui no Amazonas chegamos ao estágio de faltar oxigênio no nosso estado. O governador (Wilson Lima), no dia 26 de dezembro, decretou lockdown, aí teve manifestação dos comerciantes e ele abriu, recuou, e o que aconteceu em janeiro é de conhecimento do mundo todo.
Quando fala direita, esquerda, centro… Todo mundo tem responsabilidade. Então ´criar uma CPI pra fazer impeachment do presidente?´ Não é isso. Essa CPI é criada para ver os fatos que aconteceram pelo governo federal, pelos estados e municípios.
BBC News Brasil – Um dos pontos mencionados no pedido de abertura da CPI é a crise em Manaus, que enfrentou colapso diante da falta de equipamentos e de cilindros de oxigênio para tratar pacientes com covid-19. Como senador pelo Amazonas, o sr. avalia que o governo federal errou no apoio ao estado na pandemia, quando chegou a morrer gente por falta de oxigênio?
Aziz – Veja bem, isso é uma incógnita. O ex-ministro Eduardo Pazuello alega que não recebeu comunicado da White Martins, a White Martins diz que comunicou com antecedência. Eu acho que demoramos – e digo demoramos porque todos nós estamos envolvidos nisso, de uma forma ou de outra, direta ou indiretamente – a trazer oxigênio para o Amazonas. Se você tivesse colocado aviões para recolher de Norte a Sul oxigênio, teria chegado tanto pra capital quanto para o interior. Isso é um dos pontos que a CPI vai investigar e dar qualquer opinião agora pode comprometer as investigações.
BBC News Brasil – Críticos apontam que o sr poderia ter interesse de, a partir dos trabalhos da CPI, pressionar o governador do Amazonas, Wilson Lima, para quem o sr perdeu eleição para o governo do estado em 2018. Ou pressionar a prefeitura.
Aziz – É a primeira vez que escuto isso.
BBC Brasil – Que a CPI pode ser palco, vitrine política?
Aziz – Que ela é uma vitrine, é. Qualquer membro, qualquer CPI vira vitrine. Se você não cuidar bem dessa vitrine, você sai quebrado. Eu não faço críticas ao governador, nem ao prefeito. Acho ridículo presidente que já saiu há 20 anos ficar fazendo críticas a presidente, como se ele tivesse passado pela presidência e feito tudo correto. Como ex-governador do meu Estado, não acho justo ficar tirando proveito da vida das pessoas.
Não serei oportunista na CPI e não aceitarei que nenhum membro da CPI se esqueça que lá fora tem 380 mil vidas perdidas. Temos que ter respeito de não utilizar mecanismo de investigação como palanque político. Não me venha com discurso de ´se fosse o Lula, não estava acontecendo, se fosse o Ciro…´. Isso, não. Não terá isso. Não dá para politizar uma coisa tão séria. Perdi um irmão há 50 dias, dez anos mais novo que eu, de covid. Como vou utilizar isso?
BBC News Brasil – A primeira reunião da CPI está prevista para terça-feira (27), de forma semipresencial e com restrições de acesso, e aí a CPI vai definir as próprias regras de funcionamento. Qual formato o senhor defenderá?
Aziz – Presencialmente, estarão presidente, vice-presidente e relator. Ou pode um de nós não estar, mas ela vai estar aberta de forma presencial. Caso algum senador queira fazer semipresencial, teremos estrutura para ele participar de forma remota. As audiências que teremos, com os convidados e convocados, creio que ele terá que aceitar de forma remota ou presencial. Não podemos obrigar uma pessoa a ir lá na sala do Senado com o (cenário da pandemia de) covid. Não temos poder de obrigar uma pessoa a ir para lá e ser contaminada.
BBC News Brasil – Quais são os nomes que o sr acredita que devem ser ouvidos primeiro pela CPI?
Aziz – As pessoas ligadas à atividade do Ministério da Saúde. Os ministros que passaram e o atual. Esse programa será apresentado pelo relator aos membros da CPI e vamos aprovar.
BBC News Brasil – O senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) sugere um plano de trabalho que inclui ouvir o atual e todos os ex-ministros da saúde do atual governo, o ministro da Economia, Paulo Guedes, o ex-comandante do Exército, Edson Pujol, entre outros nomes. O sr concorda com esse plano?
Aziz – Ele fez sugestão a pedido de alguns senadores, porque é delegado de polícia. Muitas das coisas que ele está sugerindo, nós concordamos. Outras, não. Vamos esperar o plano final que o relator vai apresentar. Haverá muita discussão em relação a isso.
BBC News Brasil – Esses outros nomes que citei, Guedes e Pujol, a avaliação do sr. é que eles deveriam ser chamados?
Aziz – Em um primeiro momento, eu disse ‘chamar o Paulo Guedes para quê?’… Alguns membros agora estão argumentando que o ministro Paulo Guedes era contra o auxílio emergencial. E colocando que Orçamento deste ano não tem dinheiro para o covid, só para vacinas. Então, tendo um fato determinante para chamar o ministro Paulo Guedes ou o general, com certeza serão chamados.