• 22 de novembro de 2024

FBCB 2022 | Filmes com narrativas indígenas, pretas e periféricas são os grandes vencedores do festival

O Festival de Brasília do Cinema Brasileiro (FBCB) de 2022 será lembrado por exibir e premiar um relevante número de filmes que debatem identidades não-hegemônicas. O protagonismo do audiovisual preto e periférico brasileiro e um olhar atento às narrativas originárias deram o tom na escolha das obras premiadas, divulgadas na noite de 20 de novembro, durante a cerimônia de encerramento desta 55ª edição, realizada pela Secretaria de Cultura e Economia Criativa do DF (Secec) com a organização da sociedade civil Amigos do Futuro.

Confira a lista completa dos premiados.

O júri oficial de longas premiou A Invenção do Outro, de Bruno Jorge, como Melhor Filme. A obra acompanha a expedição humanitária na Amazônia em busca da etnia isolada dos Korubos, promovida pelo indigenista Bruno Pereira, assassinado ao lado do jornalista britânico Dom Phillips em junho de 2022, durante viagem pelo extremo Oeste do Amazonas. A produção leva também os Troféus Candangos de Melhor Fotografia, Melhor Edição de Som e Melhor Montagem.

“Segundo a psicanálise, o nosso ‘eu’ não nasce pronto, ele é um processo de construção, que começa quando a gente nasce e começa a se identificar com os atributos do outro. Somos camadas de vários outros, que a gente vai tirando e no final não sobra nada. Queria agradecer ao júri por premiar um trabalho que tem um deslocamento do eu, da desterritorialização da autoimagem”, agradeceu o diretor Bruno Jorge.

A coprodução internacional “Ceilândia-Lisboa”, Mato Seco em Chamas, de Adirley Queirós e Joana Pimenta, foi outra grande vencedora da edição, com sete Candangos: Melhor Direção; Melhor Roteiro; Melhor Direção de Arte; Melhor Trilha sonora; Melhor Atriz, em premiação dividida entre as protagonistas Lea Alves e Joana Darc; Melhor Atriz Coadjuvante, para Andreia Vieira; e Melhor Ator Coadjuvante para o coro de motoqueiros destacados no filme. Quinto longa da carreira de Adirley, a obra distópica explora os impactos da presença de movimentos extremistas em ambientes de periferia.

Rumo, de Bruno Victor e Marcus Azevedo, foi o outro longa do DF presente na Mostra Competitiva e levou o Prêmio Especial do Júri, além do prêmio de Melhor Longa pela votação do Júri Popular, confirmando a reação encantada do público no dia da exibição. O filme trata da implementação da política de cotas raciais em universidades brasileiras, a partir da experiência pioneira da Universidade de Brasília. E o ator Carlos Francisco, consagrado em Marte Um e Bacurau, ganhou seu primeiro Candango de Melhor Ator por Canção ao Longe, de Clarissa Campolina.

Entre os curtas, o protagonismo de narrativas negras se repetiu num resultado que premiou Escasso, do coletivo carioca Encruza (Clara Anastácia e Gabriela Gaia Meirelles) como Melhor Curta pelo Júri Oficial. A dupla levou também o prêmio de Melhor Direção, e Clara Anastácia foi consagrada Melhor Atriz. A obra se estrutura como falso documentário, ao narrar os anseios de uma passeadora profissional de pets em busca da casa própria.

Já o Júri Popular elegeu a produção paraibana Calunga Maior, de Thiago Costa, como Melhor Curta. O filme, que se inspira na cultura bantu para abordar relacionamentos afetivos e memórias da diáspora africana, também levou os Candangos de Melhor Trilha Sonora e de Melhor Montagem, assinada por Edson Lemos Akatoy, laureado também pela montagem de Nem o mar tem tanta água, de Mayara Valentim.

Giovanni Venturini, talentoso ator de Big Bang, venceu o Candango de Melhor Ator. Joana Claude ficou com o prêmio de Melhor Direção de Arte por Capuchinhos, de Victor Laet. E Lugar de Ladson, de Rogério Borges, venceu três prêmios na categoria: Melhor Edição de Som, para Isadora Maria Torres e Léo Bortolin; Melhor Fotografia, para Yuji Kodato; e Melhor Roteiro, para o próprio diretor. A diretora carioca Pê Moreira levou ainda o prêmio de Melhor Filme de Temática Afirmativa pelo curta Ave Maria.

A comissão de seleção de longas foi composta por André Dib, Erly Vieira Jr., Rafaella Rezende e Janaina Oliveira; e o júri que selecionou os premiados da edição foi formado por Alice Lanari, Anna Muylaert, Ana Flavia Cavalcanti, Juliano Gomes e Sérgio de Carvalho. Já os curtas foram selecionados por Adriano Garrett, Bethania Maia, Camila Macedo, Flavia Candida, Julia Katharine e Pedro Azevedo; e o júri que premiou os filmes teve em sua composição Camilla Shinoda, Carol Almeida, Dandara Ferreira, Mariana Jaspe e Ulisses Arthur.

CERIMÔNIA

Em cerimônia apresentada pelas atrizes Bárbara Colen e Dandara Pagu, as premiações foram precedidas das exibições do documentário Diálogos com Ruth de Souza, resultado de dez anos de pesquisa, filmagens e encontros da diretora Juliana Vicente com a atriz que inaugura a presença de atrizes negras nos palcos, TVs e cinema brasileiros; e do curta-metragem inédito de Anna Muylaert, O Nosso Pai, um libelo de protesto divertido e inteligente, que traz à cena três irmãs vividas pelas célebres atrizes Grace Passô, Camila Márdila e Dandara Pagu. A escolha das obras foi uma celebração à data em que se encerra o Festival: 20 de novembro, Dia da Consciência Negra.

Ainda nesta tarde, o FBCB também promoveu outra sessão especial, marcada por muita emoção, em justa celebração ao mestre Vladimir Carvalho, com a exibição do filme Quando a Coisa Vira Outra, de Marcio de Andrade. “Esse cinema fez parte da minha formação, vi muitos filmes aqui, sentado nestas cadeiras e no chão, com essa sala lotada”, lembrou o diretor homenageado. “Estar neste Festival é um lugar de conforto, onde a gente se sente muito feliz e transforma a realidade. Festival é festa, mas é lugar de reinvindicação”, ensinou.

Em 2022, Brasília voltou a pavimentar novos caminhos para o cinema brasileiro e pautar discussões de linguagem, de estéticas e de políticas públicas para o audiovisual brasileiro. “Não se assuste pessoa, se eu lhe disser que a vida é boa”, cantou a voz de Gal Costa em uma homenagem cheia de significados na abertura da cerimônia de encerramento da edição do FBCB, que marcou a volta presencial à sala do Cine Brasília após duas edições virtuais, comprovando o anseio das mais de 15 mil pessoas que passaram pelo FBCB e lotaram todas as sessões das mostras Competitiva Nacional e Brasília. A presença marcante e o envolvimento do público foram a prova de que o Festival, embora tradicional, mostra-se renovado, dada a ampla adesão da juventude do DF à programação.

Quem também levou um inesperado e merecido Troféu Candango foi Carla Queiroz, servidora da Secretaria de Cultura e Economia Criativa, que recebeu o reconhecimento pelos serviços prestados ao Festival de Brasília. Há 20 anos, ela atua diretamente na execução do evento e agora, prestes a se aposentar, recebeu a honraria das mãos do secretário Bartolomeu Rodrigues. “Gratidão por cada edição trabalhada, foi muito bom cada ano, cada edição, cada momento. E esse, ainda mais! Muito obrigada”, celebrou.

DEMAIS PREMIAÇÕES

A noite de festa e celebração trouxe ainda outras premiações. A Mostra Brasília concedeu o 24º Troféu Câmara Legislativa ao diretor paulista-brasiliense diretor José Eduardo Belmonte, que levou o maior prêmio em dinheiro da noite: 100 mil reais pelo Melhor longa-metragem na categoria de Júri oficial com o filme O Pastor e o Guerrilheiro. Por este mesmo júri, o cineasta krahô Marcelo Costa (Cuhexê Krahô) levou 30 mil reais pelo prêmio de Melhor curta-metragem com Levante pela Terra.

No palco do FBCB, elenco de Capitão Astúcia.

No júri popular, Capitão Astúcia, de Filipe Gontijo, faturou a preferência do público como Melhor longa, enquanto Desamor, de Herlon Kremer, foi o preferido da audiência entre os curtas. As produções ganharam, respectivamente, prêmios de 40 mil e 10 mil reais. A Melhor Direção foi concedida a Thiago Foresti, pelo curta-metragem Manual da Pós-verdade, com prêmio no valor de 12 mil reais. O filme também venceu Melhor Fotografia, assinada por Elder Miranda Jr.; Melhor Direção de Arte, para Nadine Diel; e Melhor Ator, prêmio concedido a Wellington Abreu.

Em outras categorias do Troféu Câmara Legislativa, Issamar Meguerditchian foi laureada Melhor Atriz da Mostra Brasília por Desamor; Juliana Corso venceu Melhor Roteiro por Virada de Jogo; Augusto Borges, Nathalya Brum e Douglas Queiroz levaram Melhor Montagem por Plutão não é tão longe daqui; Olivia Hernández foi premiada pela Edição de Som de O Pastor e o Guerrilheiro; e Sascha Kratzer levou melhor trilha sonora por Capitão Astúcia. O júri concedeu, ainda, duas menções honrosas: a Ivan Presença e a Chiquinho da UnB, personagens do longa Profissão Livreiro, de Pedro Lacerda, e ao curta-metragem Super-heróis.

A comissão de seleção dos filmes da Mostra Brasília foi composta por Sidiny Diniz, Allyson Xavier, Simônia Queiroz, Péterson Paim e Sérgio Moriconi. Já o júri oficial da Mostra reuniu Andréa Gloria, Edileuza Penha de Souza e João Paulo Procópio.

Nesta 55ª edição do FBCB, o Prêmio Zózimo Bulbul, concedido em parceria com a Associação dos Profissionais do Audiovisual Negro (Apan) e o Centro Afrocarioca de Cinema, teve júri formado por Adriana Gomes, Paula Dias e Vitor José. Venceram os prêmios de Melhores Filmes segundo este júri: o longa Mato Seco em Chamas, de Adirley Queirós e Joana Pimenta, e o curta Calunga Maior, de Thiago Costa. O mesmo resultado se repetiu no Prêmio da Crítica, oferecido pela Associação Brasileira de Críticos de Cinema (Abraccine).

O Prêmio Canal Brasil de Curtas, no valor de 15 mil reais, foi concedido ao curta Nossos Passos Seguirão os Seus…, de Uilton Oliveira, que entra agora para a grade do canal. O Prêmio Marco Antônio Guimarães, concedido pelo Centro de Pesquisadores do Cinema Brasileiro (CPCB) ao filme que melhor utiliza material de memória, pesquisa e arquivos do cinema brasileiro, elegeu o filme de encerramento do festival, Diálogos com Ruth de Souza, de Juliana Vicente, seu vencedor. Já o Troféu Saruê, oferecido pelo Correio Braziliense, foi concedido à memória do indigenista Bruno Pereira, documentado em A Invenção do Outro, de Bruno Jorge.

REEXIBIÇÕES DOS VENCEDORES

Atividades finais do Festival de Brasília, as exibições dos longas vencedores dos prêmios de Melhor Filme pelo Júri Popular e Júri Oficial estão garantidas. Na segunda-feira, dia 21 de novembro, o Cine Brasília apresenta sessões únicas de Capitão Astúcia, do diretor Filipe Gontijo, às 18h; e O Pastor e o Guerrilheiro, de José Eduardo Belmonte, às 20h. Já na terça, 22 de novembro, apresenta-se às 18h sessão única da aclamada produção do DF Rumo, de Bruno Victor e Marcus Azevedo; e A Invenção do Outro, de Bruno Jorge, às 20h. As sessões têm entrada franca.

Serviço:

Exibição dos longas vencedores do 55º Festival de Brasília do Cinema Brasileiro

Local: Cine Brasília – Entrada franca

“Capitão Astúcia”, de Filipe Gontijo

Segunda (21/11), às 18h

“O Pastor e o Guerrilheiro”, de José Eduardo Belmonte

Segunda (21/11) às 20h

“Rumo”, de Bruno Victor e Marcus Azevedo

Terça (22/11), às 18h

“A Invenção do Outro”, de Bruno Jorge

Terça (22/11), às 20h

(Ascom/Secec)

Foto: Divulgação/Ascom/Secec

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